Publicado em 04/01/2023 por Luiz Carlos de Freitas, no blog do Freitas
A posse do Ministro da Educação teve um tom diferente de muitas outras que assisti. Penso que isso se deve à própria postura do grupo que assume o MEC. Por um lado, desconhece a área e seus mecanismos de organização. Enquanto outros ministros empossados transitaram livremente pelos mecanismos de decisão, organismos e entidades, mostrando conexão com a área, o novo ministro, além de fazer “tábula rasa” das experiências na área da educação, em sua posse (e em entrevistas) não se conecta com a luta das entidades e forças progressistas do campo, não se refere às Conferências Nacionais, à recente Conferência Nacional Popular de Educação e sua Carta de Natal, preferindo isolar-se nas políticas domésticas cearenses.
E isso nos leva a outro ponto mais importante. Aparentemente, o grupo considera que o Brasil (não só o governo Bolsonaro) fracassou em matéria de educação e só o Ceará acertou. Seu critério: o IDEB alto. Logo, por esta lógica, a política educacional deve ser aquela que foi vitoriosa e obteve o maior IDEB – cuja vitrine há tempos está localizada no município de Sobral, sob liderança inicial de Izolda Cela – agora nomeada Secretária Executiva do MEC, ou “vice-ministra” da educação, em dobradinha com o ex-governador do Ceará, Camilo, agora Ministro.
Izolda foi Secretária de Educação no Município de Sobral quando Clodoveu Arruda (PT) era prefeito da cidade. E Clodoveu de Arruda foi o pioneiro na atração das atividades da Fundação Lemann para o Ceará, entre 2011 e 2016. Como ele mesmo conta:
“O Jorge Paulo Lemann visitou Sobral quando eu era prefeito, quase no final da minha gestão, pois o município tinha atingido o primeiro lugar no Ideb. Então, me convidou para passar um ano e meio nos Estados Unidos, como ‘visiting scholar’, na Universidade de Columbia. E algum tempo depois, me fez um desafio para que eu desenvolvesse um programa para, como ele mesmo denominou, “sobralizar” a educação pública brasileira”, explicou Veveu Arruda.”
E continua:
“Propus a ele montar o Centro Lemann no Brasil, focado na formação de lideranças educacionais, e ele aceitou. Tanto que hoje temos um centro de desenvolvimento de excelência da qualidade da educação brasileira, no interior do Ceará, cuja sede fica em Sobral”.
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Foi notório, durante a transição, a tendência de manter as entidades da educação a uma prudente distância protocolar. E nesta condição tiveram seus minutos para apresentar suas ideias. Claro, sim, me esqueci de dizer que “a transição não trata do programa de governo dos ministérios”. Mas, se a transição não tratou, muito menos a preocupação com as entidades e com o desenvolvimento de uma política para o MEC apareceu na postura do Ministro até agora. O Ministro, pelas suas falas, chegou com a política pronta: “sobralizar” a educação brasileira e quem entende disso é Izolda Cela – agora Secretária Executiva que deverá garantir uma atuação transversal das várias instâncias do Mec nesta direção.
A postura é típica da militância empresarial da educação que considera que a área da educação carece de objetividade, é vaga e não tem propostas concretas, pois é “muito ideologizada”. Ela é típica do Movimento Todos pela Educação, Movimento pela Base (ligado à Lemann) e outros think-tanks da reforma empresarial da educação. Além da postura, a própria política educacional em execução no Ceará, em uma coalizão PDT-PT, não é outra senão a que atende aos interesses que tais think-tanks têm com a educação.
Como atesta o depoimento de Clodoveu acima, há muito tempo estas agências estão tentando sobralizar a educação no Brasil – com receitas requentadas do fracasso educacional americano – e agora podem ter encontrado o caminho das pedras, instrumentalizando, a partir da centro-esquerda, o principal órgão formulador de políticas públicas para a educação.
E se não é assim, então, ao invés de irritar-se, seria mais produtivo enviar uma sinalização clara que contrarie esta percepção, pois há mais gente pensando assim.